João de Oliveira vence a Ultra Milano- Sanremo

No dia 27 de Abril (segunda-feira) parti para Milão, para competir na Ultra Milano- Sanremo.
Na mala levava tudo o que me era essencial, pensava eu!

Terça e Quarta-feira, fiz o treino no parque da cidade de Milão, a fim de me preparar para a prova.
Quinta-feira ao final da tarde juntamente com a equipa de apoio, fui ao ponto de encontro, onde me forneceram o dorsal e explicaram todo o percurso ao longo dos supostos 285 km.
Falaram, falaram e muito explicaram, mas para quem nada conhece da zona, pouco ou nada se fixou. Mas o mais importante é que nos tinham referido que todo o percurso estaria sinalizado com fitas e que haveria 14 check points (pontos de control e de abastecimento), o que daria em média 25 a 30 kms de distância entre cada ponto de abastecimento.
Sexta-feira pelas 1:30, eu e a minha equipa de apoio começamos a preparar tudo para levar para a prova, tendo somente alimentação e água.

Quase no início da grande aventura, o pessoal só queria tirar fotos, e mais fotos. Lá fiz o esforço, apesar de demostrar um ar calmo, o meu sistema estava em stress.
Feita a chamada dos atletas, eu coloquei-me mesmo em ultimo, e dado o tiro de partida, agachei-me, levei a mão ao solo e ergui-me para fazer o que me é normal, o meu ritual de boa sorte a mim mesmo. Quando olho em frente, já todos tinham partido, e os que estavam a ver a partida, olharam para mim com cara de espanto. Bem, ignorando a situação, lá começo eu a correr.
Passados 10 kms a equipa de apoio informa-me que me encontrava já em quarto lugar. Eu disse “fixe”, mas na verdade eu estava a fazer uma grande reta com cerca de três km ou mais, e nem ao longe via os três primeiros
Passando os 20 kms continuava a isolar-me cada vez mais, mas os três primeiros, nem vê-los.
Passando supostamente os 25 kms (informação dada pelo carro de apoio), check point, esse nem vê-lo. Vieram depois os 30, 35 kms, e nada de check point.
Continuando a bom ritmo bem perto dos 40 km, consigo passar o americano que ia em terceiro lugar. Perguntei-lhe se estava tudo bem, ele apenas sorriu e disse boa sorte. O meu ritmo perante o dele parecia que eu estava a fazer uma serie. Na verdade o americano tinha perdido o seu ritmo.
Um pouco mais à frente consigo apanhar o italiano, que ia em segundo lugar. Um atleta bem animado, apesar de já se notar o seu cansaço. Cumprimentei-o e disse, vamos, mas ele disse que não, que iria mais devagar. Então eu continuei com o meu ritmo. Perto dos 45 kms ultrapasso o suíço, que ia em primeiro lugar, falei com ele, mas somente olhou para mim, e direcionou a cara novamente em direção ao chão.
À medida que continuava a correr, olhei para trás e apercebi-me que lhe tinha dado uma distância de 200 metros num piscar de olhos.
Então a partir desse momento iniciei a liderança da prova ao longo dos restantes 240 km.
Check point, era bom vê-los, mas nem com binóculos. Veio a aparecer o primeiro check point aos 53 kms e o segundo aos 100 kms. Dos 14 check points prometidos só apareceram cinco.

Andava eu a correr no meu bom ritmo quando ao longe deparei-me com alguém a correr em zig zague, entrava na carrinha e saia outro. Com o tempo já bem perto dos possíveis 70 a 80 kms, apercebi-me que era o pessoal da organização a marcar o percurso com as fitas. Até aqui tudo bem. Mas as coisas vieram a tornar-se feias quando os apanhei e perguntei, “agora para onde tenho que ir?” resposta direta deles: “não há que enganar, é sempre em frente”, bem na verdade era mesmo, era uma reta com mais de 4 km sensivelmente. Chegando ao final havia uma bifurcação, ou esquerda ou direita, fitas, nada, porque eles vinham la atrás ainda a colocá-las. O carro de apoio também não se via, toca a ligar para a organização a perguntar a direção, por vezes não atendiam de imediato, e sempre que aconteceu isto eram cerca de quatro ou mais minutos à espera para saber para onde deveria seguir. Já estava pelos cabelos, acreditem. Mas também não era isso que me iria vergar.
Aconteceu inúmeras vezes, em cruzamentos, rotundas e mais propriamente quando tinha que entrar dentro das cidades que passava.
O percurso era sem dúvida bonito, mas bastante traiçoeiro devido as inúmeras retas no início e a meio da prova, depois apareceram as montanhas e as constante subidas e descidas desde Génova a Sanremo, era de despedaçar qualquer atleta.
Durante sexta-feira o tempo estava nublado e depois começou a chuva arrastada pelo vento que perdurou pela noite dentro ate de madrugada.
No sábado o tempo estava nublado, mas a meio da manhã começo a aquecer e o calor que vinha do mediterrâneo até sufocava as narinas. É de se dizer que sai do frigorífico e me meti na frigideira. Que tempo maluco, que se fez na prova.
Faltando 17 km para o fim estava um atleta de bicicleta da organização á minha espera, que me acompanhou ate à meta. Incrível, ele ia-me dizendo quantos kms faltavam para chegar à meta. Eu já nem acreditava em nada do que me diziam, tantas promessas e nada à vista.
La ia fazendo as minhas contas de cabeça. Quando ele me disse que faltavam 4km e me indicou ao longe que a meta era junto aos barcos (devido à orla que fazia em forma de cotovelo), as minhas pernas ganharam ainda mais força, quanto mais corria mais vontade me dava para fazer os últimos km em contra relógio. Cruzada a meta reparei que não tinha conseguido fazer o meu tempo previsto nos 285kms mas informaram-me que a prova por erro deu 290kms.
Fiquei contente por ter vencido, e por ter baixado o recorde da prova. As minhas pernas estavam bem, agradeci a elas e aos meus queridos pés por me aguentarem tantos kms.

Texto de: João de Oliveira

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