Evelise Veiga “Vou chegar a Tóquio mais madura”

Evelise Veiga

Especialista em salto em comprimento, Evelise Veiga surpreendeu quando alcançou a marca de qualificação para os Campeonatos do Mundo de Doha e para os Jogos Olímpicos de Tóquio, no triplo salto.

Nos Campeonatos do Mundo a experiência da estreia de Evelise Veiga [18.º lugar na fase de qualificação] mostrou-lhe que “estava no bom caminho” e que lhe “faltava experiência”.

Evelise Veiga “Vou chegar a Tóquio mais madura e com mais treino”

Agora Evelise Veiga, a atleta de 24 anos, que vive em Leiria, diz que olha para o adiamento dos Jogos Olímpicos como uma oportunidade para se apresentar mais madura e com mais treino.

Como é que a especialista em salto em comprimento se estreia nos Campeonatos do Mundo no triplo salto?

Sempre quis participar em grandes competições e felizmente tenho conseguido atingir esses patamares. No início da época [2018/2019], estar em Doha já era um objetivo, mas tinha de ter consciência de que não seria fácil, até porque estava a tentar a marca de qualificação no salto em comprimento e estas estão muito altas.

Há alguns anos que tenho vindo também a participar em provas de triplo salto e, como sempre gostei da pista da Maia, decidi participar. Por surpresa saiu aquela marca e foi algo inesperado. A partir daí foi trabalhar para a melhor prestação possível.

Como é que descreves essa primeira experiência em contexto de Campeonatos do Mundo?

Chegar ao Campeonato do Mundo e ver todas aquelas estrelas parece um sonho. Ainda por cima foram todos tão simpáticos…
Lembro-me de estar na câmara de chamada do triplo salto e estava lá também a Caterine Ibargüen [triplista colombiana, campeã olímpica da disciplina no Rio 2016, que haveria de ganhar a medalha de bronze em Doha]. Ela olhou para mim e sorriu e lembro-me de pensar que era simpática, até me desconcentrei um pouco [risos].

Certamente a Caterine nunca me tinha visto e estava ali a desejar-me boa sorte. Foi muito bom. Senti-me integrada e nada intimidada.

Quando chegou a altura de ir para a pista é que comecei a ficar mais nervosa, porque as provas de qualificação são muito duras, só temos três ensaios. Mas segui confiante, como estou sempre em todas as competições.

Não consegui chegar à final, mas aproximei-me do recorde pessoal, dei o meu melhor, por isso, foi excelente.

Hoje vejo que reagi bem à pressão de estar num campeonato do mundo e sei que o me falta é experiência, por isso, vou continuar a trabalhar como sempre fiz. Sei que estou no bom caminho.

Mas o teu salto de 14,32 metros, no Meeting Cidade da Maia, a 1 de junho de 2019, colocou-te também com um pé nos Jogos Olímpicos de Tóquio. O que é que sentiste, quando te apercebeste disso?

Foi um pouco surreal. Penso que só muito tempo depois tive noção do que tinha alcançado, porque fiz a prova e saiu a marca de qualificação e com muito tempo de antecedência.

Até parece fácil, mas não é nada fácil. Quando realmente me apercebi fiquei com muita ansiedade para que chegasse o momento de competir, primeiro em Doha, e, depois, nos Jogos.

Como é que geriste essa ansiedade durante o período de indefinição relativamente à realização dos Jogos Olímpicos?

Inicialmente, quando começou esta pandemia, tentei não ver muitas notícias, porque queria estar focada no treino e não queria desmotivar-me.

Quis focar-me, porque tinha de estar em forma no final de maio, já que nos planos estava ainda tentar a marca de qualificação no salto em comprimento e o processo de preparação teria de ser mais acelerado do que o normal, considerando as datas das provas, na altura, que tinha para conseguir a marca.

Por isso, quis manter-me afastada e a minha treinadora [Cátia Ferreira] é que estava a acompanhar tudo passo a passo.

Como é que reagiste quando “a mensageira” confirmou que os Jogos Olímpicos seriam mesmo adiados para 2021?

Quando chegou a confirmação tentei ver as coisas pelo lado positivo, que é o de chegar lá mais madura, com mais treino e com mais competições pelo meio, que vão certamente ajudar a melhorar a minha performance. Portanto, tentei olhar para isto sempre como uma oportunidade.

Com as novas regras e datas achei que já não tinha tanto tempo como numa primeira fase parecia que teria, mas vou ter um ano para treinar e continuo concentrada em manter o foco, porque as competições vão ter de acontecer.

Como é que adaptaste o teu treino à nova realidade Evelise Veiga?

O treino de um saltador passa muito por ginásio, saltos e velocidade. O facto de não poder usar as instalações do Estádio Municipal [de Leiria] iria comprometer o meu treino, porque sem trabalho de força iria perder a forma, inevitavelmente.

A solução que encontramos foi levar alguns dos materiais do ginásio para casa. Assim, pelo menos a parte de ginásio não ficava completamente comprometida.

Numa primeira fase fecharam todas as instalações, sendo que em caso de necessidade poderia usar o Polis. Atualmente eu e a Irina [Rodrigues] temos disponível o Centro Nacional de Lançamentos, onde treinamos em horas diferentes para garantir a segurança.

A par do treino, como é que reorganizaste as outras áreas da tua vida?

Quando surgiu a questão do confinamento, pensei que, olhando para a minha rotina, não seria muito diferente, porque a minha vida já se resumia praticamente a treinar e estar em casa. Sou uma pessoa muito sedentária [risos].

Estou a tirar a licenciatura em Gestão e essa seria a principal mudança, porque passaria a ter aulas em casa. Mas ao fim de duas semanas já tinha feito tudo: arrumar a casa, colocar as séries, os filmes e a leitura em dia… Agora até já tenho saudades de ir a um shopping, que era coisa que não fazia muitas vezes.

Depois, aqui em casa somos quatro [pai, mãe e irmão de 21 anos] e já começa a ser sufocante, porque a minha mãe quer fazer tudo em casa e o meu irmão também já está “a dar em doido”, principalmente comigo. Estamos sempre “a lutar” pelo comando da televisão, porque cada um quer ver sua coisa [risos].

O que é que esta pandemia te ensinou?

Que nunca sabemos o que vai acontecer amanhã. Mostrou-me que nada está garantido, o quão importante é ter saúde e que devemos valorizar as pequenas coisas. Não devemos dar nada por adquirido e devemos ser gratos.

Se tiveres um dia de escolher entre o salto em comprimento e o triplo salto, para onde irá “pender” o teu coração?

Adoro o salto em comprimento. Foi onde tudo começou. Até experimentar o salto em comprimento, só conhecia o correr para a frente e o corta-mato. Depois descobri que havia uma pista e provas técnicas e nunca mais quis sair de lá. É uma grande paixão.

O triplo salto é muito duro para o corpo, mas também gosto bastante de o fazer. Portanto, o que posso dizer é que vou dar sempre o meu melhor seja em que disciplina for.

Que mensagem gostarias de deixar para todos aqueles que seguem a tua carreira?

Antes de mais agradecer todo o apoio e carinho, que é essencial para um atleta. É muito importante saber que as pessoas estão connosco e que nos reconhecem e ao nosso trabalho. Agradeço muito, porque sinto muito isso.

Espero continuar a evoluir, fazer grandes conquistas e dar muitas alegrias. Ainda não fiz uma coisa fantástica, mas espero ainda vir a fazê-la.

Como uma medalha de ouro nos Jogos Olímpicos?

[Risos] Acho que todos os atletas têm esse sonho, mas poucos conseguem chegar às medalhas. Mas, sim, tenho essa vontade de um dia conseguir uma medalha olímpica.

BI de Evelise Veiga

Evelise Veiga Evelise Maria Tavares da Veiga
Nasceu a 3 de março de 1996
Natural da ilha de Santiago, Cabo Verde
Naturalizada portuguesa a 4 de abril de 2012
Atleta do Sporting Clube de Portugal desde 2018
Recorde pessoal no salto em comprimento: 6, 61 metros (recorde nacional)
Recorde pessoal no triplo salto: 14, 32 metros

Principais feitos

– Finalista (8.ª) no comprimento do Campeonato da Europa de 2018
– 5.ª no comprimento do Europeu de sub-23 em 2017
– Vencedora do triplo salto e segunda no salto em comprimento das Universíadas de 2019
– Vencedora no comprimento (e 2.ª no triplo) do Campeonato do Mediterrâneo de sub-23 em 2018 (5.ª no comprimento em 2016)
– Campeã de Portugal de comprimento em 2016 (ar livre), 2017, 2018 e 2019 (ar livre e pista coberta) e comprimento em 2020 (pista coberta); vice-campeã de pista coberta em 2013 e 2016 (e de triplo em 2018 e 2019)
– Melhor portuguesa do ano no comprimento em 2017, 2018 e 2019 (2.ª em 2016)

Texto: Vanessa Pais – Federação Portuguesa de Atletismo
Foto: FPA

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